As
medidas protetivas de urgência da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) podem
ser aplicadas em ação cautelar cível satisfativa, independentemente da
existência de inquérito policial ou processo criminal contra o suposto
agressor.
O
primeiro dado a ser considerado para compreensão da exata posição assumida pela
Lei Maria da Penha no ordenamento jurídico pátrio é observar que o mencionado
diploma veio com o objetivo de ampliar os mecanismos jurídicos e estatais de
proteção da mulher. Por outra ótica de análise acerca da incidência dessa lei,
mostra-se sintomático o fato de que a Convenção de Belém do Pará – no que foi
seguida pela norma doméstica de 2006 – preocupou-se sobremaneira com a especial
proteção da mulher submetida a violência, mas não somente pelo viés da punição
penal do agressor, mas também pelo ângulo da prevenção por instrumentos de
qualquer natureza, civil ou administrativa. Ora, parece claro que o intento de
prevenção da violência doméstica contra a mulher pode ser perseguido com
medidas judiciais de natureza não criminal, mesmo porque a resposta penal
estatal só é desencadeada depois que, concretamente, o ilícito penal é
cometido, muitas vezes com consequências irreversíveis, como no caso de
homicídio ou de lesões corporais graves ou gravíssimas. Na verdade, a Lei Maria
da Penha, ao definir violência doméstica contra a mulher e suas diversas
formas, enumera, exemplificativamente, espécies de danos que nem sempre se
acomodam na categoria de bem jurídico tutelável pelo direito penal, como o
sofrimento psicológico, o dano moral, a diminuição da autoestima, a
manipulação, a vigilância constante, a retenção de objetos pessoais, entre
outras formas de violência. Ademais, fica clara a inexistência de exclusividade
de aplicação penal da Lei Maria da Penha quando a própria lei busca a
incidência de outros diplomas para a realização de seus propósitos, como no
art. 22, § 4º, a autorização de aplicação do art. 461, §§ 5º e 6º, do CPC; ou
no art. 13, ao afirmar que "ao processo, ao julgamento e à execução das
causas cíveis e criminais [...] aplicar-se-ão as normas dos Códigos de Processo
Penal e Processo Civil e da legislação específica relativa à criança, ao adolescente
e ao idoso que não conflitem com o estabelecido nesta Lei". Analisada de
outra forma a controvérsia, se é certo que a Lei Maria da Penha permite a
incidência do art. 461, § 5º, do CPC para a concretização das medidas
protetivas nela previstas, não é menos verdade que, como pacificamente
reconhecido pela doutrina, o mencionado dispositivo do diploma processual não
estabelece rol exauriente de medidas de apoio, o que permite, de forma
recíproca e observados os específicos requisitos, a aplicação das medidas
previstas na Lei Maria da Penha no âmbito do processo civil. REsp
1.419.421-GO, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 11/2/2014.
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